Sempre que vou à Vila Elzir Cabral, do Ferroviário, na Barra do Ceará, tenho alguma surpresa. No último domingo, dia 5/7, no entanto, tive duas surpresas: uma, desagradável (a vitória do Alecrim (RN), por 1 x 0, com gol aos 49 minutos / 2º tempo); outra, agradável (conheci, pessoalmente, o treinador Lula Pereira). Durante os 12 anos que moro aqui, em Fortaleza, foi a primeira vez que conversei, pessoalmente, com o ex-técnico do Ceará (foto).
Ter encontrado o treinador Lula Pereira, 53 anos, num estádio de futebol, teria sido um fato normal caso eu não tivesse convivido com o pai dele, o também treinador Geraldo Pereira. E disse isso a Lula Pereira. Ele ficou emocionado, eu também. Rapidamente, remontamos um passado distante no tempo, mas bem próximo em nossas memórias.
Eram 17 horas, estávamos no intervalo do jogo, eu tinha pouco a dizer no comentário que faria para a Rádio Globo Fortaleza. O Alecrim jogou recuado durante todo o primeiro tempo. O Ferroviário insistiu em erros táticos e esbarrou na retranca: 0 x 0. Em dois minutos eu faria o comentário. Foi o tempo que durou a conversa de apresentação entre eu e Lula. Logo a seguir o entrevistei, não sobre o jogo, mas sobre a importância de "Seo GP" na minha história de vida.
Em 1980, eu vivenciava os primeiros aprendizados no rádio esportivo. Um repórter faltou ao serviço (é sempre assim). Recebi, então, a missão de entrevistar o treinador do Fluminense de Feira (BA), Geraldo Pereira ou "Seo GP", como era tratado respeitosamente. De posse de um pesado gravador National fui cumprir a missão.
Depois de acompanhar um treino recreativo, numa ensolarada manhã de sábado, encarei a concorrência e fiz a entrevista. Já estava indo para a emissora, caminhando, sol a pino, resolvi conferir a gravação. Tive sensação de calafrios quando percebi que não tinha gravado nada. Decidi voltar ao estádio Jóia da Princesa e corrigir o erro.
Dez minutos depois, esbaforido, estava eu diante de "Seo GP" na saída do estádio. Um misto de homem sisudo e sorridente, banho tomado, provavelmente faminto, certo do dever cumprido e solícito. Depois de ouvir minhas desculpas me deu tapas nas costas e disse: "Vamos lá, garoto. Quando está começando é assim mesmo. Conte comigo". Foi uma grata lembrança.
Lula Pereira ainda teve tempo para relembrar passagens marcantes da convivência entre eles (pai e filho). "Ele era correto, duro no trabalho, tão dedicado que colocava o Fluminense no Hotel dele sem nada receber. Morreu cedo (antes dos 70 anos) por causa da teimosia", disse emocionado.
Nos despedimos. O segundo tempo começou e o Ferroviário voltou a insistir na bola aérea, sem trabalhar pelo meio e pelas laterais do campo. Como num flash, voltei 29 anos no tempo, para lembrar que Geraldo Pereira ensinava aos gritos: "Cruza rasante na área". Traduzindo: pedia aos pontas para que cruzassem a bola à altura do umbigo. Para "Seo GP", "essa bola era mortal". Se era ruim para os atacantes, pior ainda para os zagueiros.
Olhar fixo no gramado da Vila Elzir Cabral, finalzinho de jogo, eis que o Alecrim percorre o caminho outrora indicado pelo pai de Lula Pereira. Um contra-ataque pela esquerda (digo ponta-esquerda) e o veloz Wesclei dispara em direção ao gol. Não cruza rasante. Chuta forte, rasteiro, vencendo o goleiro Jéfferson: 1 x 0. Convenhamos, o tempo passou e "Seo GP" continua vivo na prática.
Geraldo Pereira morreu há quatro anos, em Feira de Santana, na Bahia. Fez tudo no Fluminense de Feira, principalmente nos momentos de crise. Natural de Olinda (PE), Lula Pereira chegou a trabalhar com o pai, no início da carreira, mas alçou voo e fez nome no futebol pernambucano, como zagueiro do Sport e do Santa Cruz. Encerrou a carreira no fim da década de 80, no Ceará Sporting, onde também escreveu história como treinador.
Dentro da sua simplicidade, Geraldo Pereira também garimpava novos jogadores e revelou alguns craques que jogaram em grandes equipes. Por exemplo, o meia Paulo Roberto, que jogou no Vasco da Gama, na década de 70. Lembra-se dele? O texto abaixo é o maior testemunho dessa história.
2 comentários:
Comovente !!!!
Que bonito Jotinha, uma bela retornada ao passado, o seu inicio com uma trajetória vitoriosa.. A minha entrada no rádio foi mais ou menos assim, que como narrador, faltou o locutor da rádio Tapuyo de Mossoró, e como imitava alguns narradores do Brasil, fui apontado por um amigo para narrar uma decissão de futebol de salão na quadra da ACDP em Mossoró.. 1971. E deu certo. Era bola com pelerrrr, levourrrrrrrrrr;.. Mas , os erros foram perdoados, nunca tinha impunhado um microfone "cabeça de gato" lembra ?? rsrsrs Parabéns pelo seu blog Jotinha.
Abraço do amigo Vavá (Evaristo)
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